18 de março de 2011

retrovisor

É depois de tudo, depois de toda a rotina de cada dia, que a magia se faz. Depois do dia, no fim da noite. Depois do “até amanhã”.

Depois de tudo, sorriu frente às letrinhas na tela do celular que desenham um endereço. Uma ruazinha escondida, colocada propositadamente no mapa e no coração.

Entrou no carro, sorrindo por uma felicidade que ainda lhe ia acontecer, dali há instantes. Olhou no retrovisor e se surpreendeu com os próprios olhos um tanto pequenos, devido ao largo sorriso incontido que teimava em não lhe escapar. Olhou no retrovisor e se viu feliz naquele momento. Gostou de ver a felicidade em si ao mesmo tempo em que se via na felicidade.

A felicidade é quase simples, pensou. Um retrovisor e uma memória de futuro.

Ligou o carro como quem apressa o tempo.

Foi ao encontro da sua inseparação. Foi viver momentos indizíveis no silêncio. Foi viver as redundâncias. Foi não temer. Foi amar.


“Eu não olho mais nos olhos da mulher que tenho em meus braços, mas os atravesso nadando, cabeça, braços e pernas por inteiro, e vejo que por detrás das órbitas desses olhos se estende um mundo inexplorado, mundo de coisas futuras, e desse mundo toda lógica está ausente. (...) Quebrei o muro (...), meus olhos não servem para nada, pois só me remetem à imagem do conhecido. Meu corpo inteiro deve se tornar raio perpétuo de luz, movendo-se a uma velocidade sempre maior, sem descanso, sem volta, sem fraqueza (...)”

Henry Miller – Trópico de Capricórnio.