23 de fevereiro de 2009

Vir

Está se aproximando.
Eu posso quase sentir.

Mas sei que já consigo ver. Antes, eu tinha medo de ver.
Eu ainda sou uma cega que simplesmente vai.
Agora sou uma andante cega, que vê.

Não é que eu não tenha medo. Não sei se o que eu sinto ainda tem esse nome. Mas eu já não fujo mais.
Eu fico num silêncio quase sacerdotal... Vendo. Vendo se aproximar.
E é quando eu faço silêncio, que se aproxima mais. Ou então... Quando eu vejo em silêncio.
Quando eu vejo em silêncio... Às vezes, evito ver em silêncio porque me provoca um quase sentir. Às vezes ainda finjo que tenho medo desse quase sentir. Mas sei que já consigo sorrir discretamente em relação a ele.

Sei que vem na minha direção.
Também em silêncio. Com sua sapiência silenciosa.

E às vezes existe um vento tão forte! Mas eu fico. Sinto que os meus cabelos voam, e minhas roupas dançam querendo acompanhar o movimento dos cabelos. Só ficam, porque estão presos à mim. E eu... Eu fico.
Parada. Olhando. Eu fico.

Já não fujo mais, mas ainda não lhe abro os braços.
Eu só olho. Com os dentes cerrados, eu engulo alguma coisa que não tenho na boca. Minha respiração fica mais rápida, meu coração às vezes torna-se mais denso. Mas eu fico.

Eu olho com os meus olhos de cega, querendo decifrar o que vejo.
Ás vezes escondo de mim mesma... Fingindo não saber o que é. Só pra ter o passatempo de quase sentir de novo, e de ver de novo. E de ficar.


Ao longe, eu vejo se aproximar.
E fico.

6 de fevereiro de 2009

Meio

Esses dias, eu...

Eu nem sei.
Existe um certo silêncio morno, uma ausência de alguma coisa que... que não é ausência... É exatamente a presença, mas... Ela é tão calada que às vezes... Me some.

Esses dias, eu não estou conseguindo me explicar.
Aos poucos adquiro a coragem necessária ao 'não -tentar'. Às vezes consigo... Às vezes não.

Voltei a ler Clarice. O meu mesmo livro. O meu mesmo Eu. Pode ser o limite da heresia, mas... às vezes eu penso que Clarice é minha auto-ajuda.

Ultimamente... Meu coração anda pesado. É quase uma dor fina.
É como se eu andasse sempre com uma interrogação no rosto, mas... Mas andasse sempre pra frente.

Eu penso em como escrever alguma coisa aqui que não seja cópia do que a Clarice versa no 'meu' livro, mas...
Não acho que exista.

É como se eu estivesse dentro do (m)ar. E por estar dentro, não consigo vê-lo inteiro. Não consigo dar uma forma conhecida a mim mesma, daqui de onde estou. Sei que acordo de manhã e faço coisas. Coisas que um dia eu sempre sonhei fazer.
Mas é que quando os começos dos sonhos, mesmo dos pequenos, estendem sua ponta de realidade.... Eu sinto medo.

Eu sinto medo de estar no meio... do sonho(?). Ser o meio de mim, ainda me assusta um pouco.

Eu, de acordo com minhas teorias psicológicas baratas, sei que é medo do novo, o top dos chichês.
[Mas dos clichês, eu só entendo os meus]

Não quero colocar aqui que eu estou "naquela fase que..." e completar com alguma idiotice generalista, pra fazer com que eu entenda o que escrevo.

Hoje, eu não quero entender o que eu escrevo.
Só quero escrever.
Sem porquê, sem sentido. Mas é inevitável eu me lembrar de Clarice nessa hora e dizer que a ausência do sentido é o próprio sentido.

Eu mais ou menos sei, que tenho um propósito. Mas, quando eu penso sobre ele, ele some. Eu tenho um propósito, mas não tenho a justificativa do meu propósito.

Eu vivo coisas e não sei bem porquê. E hoje, eu vou ter a coragem de não tentar descobrir.